quinta-feira, novembro 03, 2005

Uma história do tempo que fez


Esta é uma história complicada, assim uma espécie de menina perdida no bosque, um passarito tonto de ar à procura de ninho nos céus de uma noite escura.

É tão complicada esta minha história que nem sei já se a sonhei, se foi mesmo assim. Lembro-me de ser muito pequenino, do tamanho das sombras dos móveis e da tarde, tão pequenino que não sabia fazer muito mais do que olhar para cima, olhar sempre para cima para as pessoas e as coisas maiores do que eu...

Vivia então numa casa enorme. Tão grande aquela casa! Nela havia meia dúzia de vasos (maiores do que eu) com flores que me encantavam e que eram azúis como quando o céu é azul e que eram liláses como quando o céu é lilás. E havia um telefone branco que, como todos os telefones brancos, só tocava para dar notícias felizes. E na casa havia um gato cinzento, chamado Pompom, que a minha irmã agarrava pelo pescoço e arrastava ao longo da casa grande onde vivíamos...


A verdadeira história, porém, não é esta. É outra e nem sei se se passou, se foi coisa dos sonhos que se sonham inteiros em noites de bochechas gordas e pálpebras pesadas.

Essa outra história é assim: havia naquela casa uma frase tremenda que me perturbava. Era frase estranha e dizia, às vezes, assim:

é tempo de me ir embora!

Outras vezes, a frase mudava e dizia:

que tempo faz hoje? Está bom tempo? Está mau tempo?

E, ainda outras vezes, a frase dizia:

mesmo a tempo! Ainda bem que chegaste a tempo.

Eu, pequenino, andava ainda pela casa grande tropeçando nas sombras a tentar descobrir que coisa seria essa: o Tempo.

Uma vez, percebi. Percebi que o Tempo vivia fora da janela. E mandava no céu. Se vestia de Sol, o Tempo era bom. Se o vento soprava devagar, era o Tempo Agradável, bom de viver. Mas se, o céu se complicava e era cinza e a boca do vento empurrava brisas velozes, se as nuvens choravam tristezas de chuva, era um outro Tempo, que diziarn mau, que não era feito para se gostar mas para viver em agasalhos ou nos esconderijos das casas...

No entanto, havia um outro Tempo. Vivia dentro de casa comandado por senhores de cara redonda e bigodes direitos, muito espetados, a rodar, muito devagar, contando o Tempo. Era o Tempo dos relógios - descobri! E por ele sabíamos se estávamos atrasados, se chegávamos adiantados ou a Tempo. Ou se era Tempo de dormir ou de acordar.
E eram esses os mistérios todos que fizeram esta história complicada - que nem sei já se a sonhei se a escrevi mesmo a tempo, antes de a esquecer... Poderás tu ajudar-me a explicar, a revelar este mistério do Tempo?

Alexandre Honrado

3 Opiniões

Anonymous Anónimo said...

Muito lindo! Comecei a ler e, eu que te gabo às pessoas reconhecendo que escreves muito bem, à medida que te ia lendo reforçava em mim o pensamento: "Este miúdo esvreve mesmo bem!"
E escreves...
beijinho
da mana marina

sexta-feira, 04 novembro, 2005  
Blogger Siddhichandra said...

Esse ruído marcava os ritmos da vida.
Desde pequeno que aprendi a contar cada minuto, cada hora, cada dia em versos de sombra ígnea.

A realidade para mim era a ilusão. A ilusão para mim era a vida. Construí desde cedo castelos de areia nos areais do sonho e conheci as cores das borboletas pelos tons do fogo.

Agora é hora de dormir, de decompor em novas cores as novas paisagens e maravilhar-me com o pouco que conheço, com o tanto que sonho.

Um abraço e Obrigado

segunda-feira, 07 novembro, 2005  
Blogger Siddhichandra said...

Olá Semiramis!

Não somos assim tão pró-activos em relação ao tempo. :-)

Ele também influencia a nossa maneira de estar e de querer... hoje que chove só me apetece estar em casa a ouvir piano (ou a banda sonora do África Minha que é das minhas preferidas para dias de chuva)

Quanto ao conto a várias mãos.. há de haver outras oportunidades. Planeio algo melhor organizado e depois comunico!

Um abraço

segunda-feira, 21 novembro, 2005  

Enviar um comentário

<< Home

Click for Lisbon, Portugal Forecast